17 de jul. de 2015

Day 103: Dersu Uzala (20 de junho)


Como pode um homem viver numa caixa?
Dersu

Na véspera do início do inverno no hemisfério sul, decidir ir à Sibéria com um filme que eu levei tempo demais para ver. 

Dersu Uzala, dirigido por Akira Kurosawa em 1975 a pedido do embaixador russo à época, é muito mais do que eu esperava. Os primeiros anos do século XX testemunharam muitas mudanças ao redor do mundo, até mesmo nas regiões mais remotas. Os dois personagens principais representam os deferentes impactos da modernidade: um capitão russo encontra um caçador tribal em uma de suas missões de reconhecimento de território. Um confronto poderia facilmente surgir do seu encontro, mas o que acontece é quase que o contrário: um profundo respeito mútuo e uma grande amizade nos prova como diferentes formas de vida são de possível coexistência -  mesmo que a partir de dois homens tão especiais. 

Mas há coisas que não estão sob o controle dos dois. O mundo moderno, na visão de Kurosawa, não permite a existências dos modos mais simples de outrora. Nesse sentido, o pensamento do cineasta encontra o de Walter Benjamin - eu mencionei suas ideias há três posts. O aprendizado por experiência e não apenas pelo intelecto é uma grande lição aqui, e o Capitão valoriza e admira tudo o que Dersu compartilha com ele por meio de ações e palavras simples. 

A fotofrafia é um destaque na forma de contar a história aqui. A cada cena, eu não conseguia evitar de pensar o quão difícil deve ter sido a filmagem de cada uma delas. O filme é tão arrasadoramente lindo, que já nos primeiros  minutos eu me encontrava em um estado quase meditativo. Alguns filmes têm esse efeito, e Dersu Uzala o faz  de maneira magistral nesse e em vários outros aspectos. 

De outro lado, há a tristeza, a perda e a futilidade de alguns elementos da modernização, também apresentados por Kurosawa, e assim tom final do filme é de luto e melancolia - um sentimento que se adequa ao que presenciamos na útlima parte dessa história, com Dersu perdendo suas conecções com a natureza, perdendo a si mesmo num mundo que não faz mais sentido para ele. É devastador, principalmente pelas imagens poéticas de Kurosawa. 

Um último pensamento: Há cineastas que nós respeitamos e admiramos pelas realizações de toda sua vida, mesmo que não tenhamos ainda conhecido alguns de suas mais elogiadas obras. Assim ocorreu comigo com alguns desses cineastas. Depois de assistir a Manhattan, 1979, de Woody Allen, e a Taxi Driver, 1976, de Martin Scorsese, há cerca de dois anos, eu finalmente pude entender o quanto eles são geniais - apesar de já o admirá-los há tempos. O mesmo aconteceu agora com Kurosawa' em Dersu Uzala. Um filme espetacular, que transcende seu próprio tempo - justamente por isso são conhecidos os clássicos. 

http://onemovieadaywithamelie.blogspot.com/2015/06/day-103-dersu-uzala-june-20.html




Dersu Uzala. Dirigido por Akira Kurosawa. Com: Mksim Munzuk, Yuriy
Solomin. Roteiro: Akira Kurosawa, Yuriy Nagibin a partir do livro Dersu,
Okhotnik
, deVlaldimir Arsenev. URSS/Japãpo, 1976, 144 min., 76 mm 6 Track,
(70 mm prints) Mono (35 mm prints), Color (Sovcolor)  (DVD).


PS: A primeira vez em que percebi como um filme pode ser uma forma de meditação foi com A Partida  (Okuribito),  uma produção japonesa de 2008, Durante os créditos finais, ninguém deixou o cinema. Um silêncio tomou conta de todos nós, e eu me dei conta como eu estava meditativa. Já havia acontecido comigo antes, mas essa foi a primeira vez que eu pude dar um nome a esse estado.

PPS: Eu costumo chamar meu apartaento de uma pequena Sibéria. O sol apenas alcançar parte da sala durante dois meses por mês, e nao mais. Não estou reclamando, essa é uma boa característica numa cidade tão quente. Mas ontem, estava frio para os padrões de Brasília: 16 C. Dersu Uzala, então, foi uma escolha apropriada a uma noite gelada. Hoje de manhã, a cidade pareceu lembrar que as estações existem, e o dia amanheceu cinzento para saudar o pirmeiro dia do inverno :)

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