6 de jul. de 2015

Dia 54: Cake: Uma Razao para Viver (2 de maio)

Cake, finalmente!!!

Hoje, eu conseguir chegar a uma sessão das 11h (minha favorita) de Cake, o falado filme com Jennifer Aniston num atuação considerada por muitos como digna de um Oscar. As indicações não foram o que se esperava, no entanto (melhor atriz no SAG, Globo de Ouro e alguma premiação menor). A maioria dos comentários que li sobre o filme se debruçaram sobre o que seria uma forma de fracasso. Como se uma premiação pudesse por si definir uma performance ou a qualidade de uma produção - totalmente sem sentido, na verdade.  

Mas, vamos ao começo. Nas primeiras cenas de Cake, eu me vi de fato bastante irritada. O personagem de Aniston, Claire, encontra-se em uma profunda e contínua dor, a qual está tão à flor da pele que Claire a carrega em cada um dos seus mínimos movimentos, além das inúmeras cicatrizes do seu corpo. A atuação de Aniston foi tão pesada (tanto pela atriz quando pela direção, eu acho), que na primeira vez que ela surge em cena eu cheguei a me encolher. De verdade. Foi uma reação física, e eu temi pelo restante do filme - o que é difícil de admitir, porque eu realmente estava torcendo pelo filme, como sempre torço pela carreira de Aniston. 
Claire não é uma personagem cativante que pede pela nossa simpatia e pena. É justamente o contrário: ela quer nos quer à distância, deixando-a sozinha. Ela trata o espectador como todos ao seu redor. Nós estamos no mesmo patamar que os outros personagens, e para mim essa é a grande sacada do filme. Eu senti uma grande repulsa de início. Mas, cena a cena, esse cenário foi mudando. As pessoas ao redor de Claire são bastante compreensivas (exceto talvez seu grupo de apoio, ironicamente), mas não condescendentes. Então, lentamente, nós também acabamos por nos importar com ela, percebendo finalmente o que de fato está acontecendo ali. 

Os personagens secundários são tão fortes, fora do âmbito dos habituais clichês, que nós ficamos ao lado deles em torno de Claire, tentando permanecer com ela apesar da sua convincente estratégia de permanecer afastada de tudo e todos no mundo, exceto a sua dor. 

Não há sequer uma única gota de sentimentalismo nesse filme. Para mim, isso demonstra um grande respeito com aqueles que passam por tal dor, como a vivenciada por Claire. E nós a conhecemos num momento de sua vida em que ela é capaz de viver apenas essa dor. 

Trata-se de um verdadeiro inferno, e ela se encontra diante de três alternativas: continuar a viver dessa forma, sair dessa dor (como?), ou por um fim no inferno acabando com a própria vida. Sabemos o que ela quer no início, mas a sua jornada no sentido de perceber o que é realmente constitui os 102 minutos do filme.  

Ontem, eu escutei uma música do The Cure no carro, e ela veio à minha cabeça enquanto testemunhava Claire vivenciando sua dor.  Jumping Someone Else's Train: Claire faz exatamente isso, se joga no lugar de outrem, a fim de buscar algumas respostas. Ao assumir o modo como outra pessoa lidou com uma dor tão grande que se torna o mundo de quem a vivencia, ela pode descobrir afinal o que ela de fato deseja para si mesma.

Foi somente em uma cena quase ao fim do filme que eu pude perceber como Claire havia me conquistado. Meu coração estava apertado no meu peito, meus olhos cheios de lágrimas. E assim eu permanecei durante até a última cena, esquecendo da atuação e direção exageradas do início, não pensando em mais nada além de Claire e a situação por que ela passa. 

Em situações cotidianas ou extremas na vida, nós acabamos por nos encontrar diante das mesmas opções de Claire em Cake: ficar fiel à dor para sempre (o que não é uma opção na verdade); entregar-se totalmente, ou lidar com o inferno de frente, de uma vez por todas ou aos poucos, não importa. Mas sentando ereta de forma a olhar a vida de frente, não se escondendo mais na dor contínua.  Com ocorre em outros filmes, este vai além do seu argumento principal, atingindo muitos outros aspectos da vida - e por isso o cinema é tão fundamental. 

Um desses aspectos é como constantemente tentamos evitar a dor, de fato fugindo de qualquer possibilidade de sermos felizes, seja lá o que isso signifique. Mas podemos acompanhar Claire também nesse sentido, tentando ao menos olhar a vida com olhos límpidos e abertos, a cada instante dolorido e mesmo assim incrível da nossa existência. 

http://onemovieadaywithamelie.blogspot.com/2015/05/day-fifty-four-cake-may-2.html



Cake. Dirigido por Daniel Barnz. Com: Jennifer Aniston, Anna Kendrick,
Adriana Barraza 
(a incrível Silvana), Sam Worthington. Roteiro:
Patrick Tobin. EUA, 2014, 102 min., Dolby Digital, Color (Cinema).


PS: Cake não estava no Oscar 2015, mas um de seus temas centrais fez duas surpreendentes aparições durante a premiação. Primeiro foi a produtora Dana Perry, ao chamar a atenção, no seu discurso de agradecimento, sobre as razões pelas quais nós deveriamos falar sobre suicídio em voz alta, dedicando seu Oscar de Melhor Documentário para seu filho. Posteriormente, foi a vez do destacado discurso de Graham Moore's ao aceitar o Oscar de Melhor Roteiro Adaptado por O Jogo da Imitação (The Imitation Game): "Eu tentei o suicídio aos dezesseis anos e agora eu estou aqui. Eu dedico este momento para aquela jovem que está por aí e que não se sente adequada em lugar nenhum. Não é verdade. Mantenha-se estranha. Seja diferente, e então quando for a a sua vez, e você estiver em pé neste palco, passe a mesma mensagem adiante". As razões por que alguém se vê com um desejo intenso de por fim à própria vida não são iguais para todos, mas o sentimento de se ver sem outra opção é absoluto naquele momento... até que, felizmente, não é mais. Mas mutos tragicamente não consegue alcançar essa percepção. 

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